Índice22

Sobre teatro, processos e certezas – ou a falta delas

Estou aqui diante de vocês sem saber como começar ou o que dizer exatamente. Confesso que não me sinto muito à vontade quando tenho que escrever, pois sempre me expressei através das palavras de outros. Meu corpo sempre foi o veículo que comunicou minhas emoções, pensamentos, ideias.

É difícil falar de teatro, processo, construção artística, quando você é objeto da própria criação. Mente, nervos, sangue, vísceras, pele, pêlos, todos envolvidos em algo que pulsa, expurga, dilacera, condensa o tempo todo!

Mergulhar no abismo, tatear no escuro, rasgar-se, dilacerar-se, perder-se tantas vezes, encontrar-se com o nada ou de vez em quando, com nossas sombras. Para mim, criar é colocar-se em estado constante de ebulição. É desconhecer-se para poder encontrar outras versões de si mesmo, ou talvez de algo que está além e apesar de si mesmo.

Nesse momento em que completo 30 anos de trajetória no teatro, encontro-me numa fase em que não me interessa reafirmar absolutamente NADA. E é nesse momento de total incerteza que nasce Índice 22. Mais do que para comemorar, acredito e assim quero que seja, é para celebrar! Celebrar o teatro, celebrar a vida, a possibilidade de viver e sobreviver de arte, de poder criar, criar e criar!

Denise da Luz

foto by Leonam Nagel

Release

Texto autoral da companhia reflete a espetacularização do cotidiano

Comemorando os 30 anos de carreira da atriz itajaiense Denise da Luz, a Téspis Cia de Teatro estreia o espetáculo intitulado Índice22. No solo, a atriz interpreta uma personagem que reflete a espetacularização da violência em nosso cotidiano através das relações sociais.

Escrito e dirigido por Max Reinert, Índice22 apresenta uma narrativa fragmentada, bastante comum em tempos de mídias sociais, instigando a plateia a pensar sobre os comportamentos que expõe nossa vida no mundo virtual.

Apresentamos no espetáculo uma expansão do corpo da atriz utilizando experiências com luz, vídeo, som e interatividade, recursos que nós da Téspis Cia de Teatro temos investigado em nossos últimos trabalhos”, comenta o diretor. A apresentação é indicada para maiores de 16 anos.

A montagem do espetáculo é realizada por meio da Lei de Incentivo à Cultura, Fundação Cultural de Itajaí e Prefeitura de Itajaí, com renúncia fiscal da Brasfrigo e com apoio da Barbieri Litoral. A manutenção da Itajaí Criativa – residência artística é patrocinada pela PROCAVE – Empreendimentos e Incorporações.

Denise da Luz: 30 anos de amor ao Teatro

Denise da Luz, 51 anos, é uma personalidade do cenário itajaiense de teatro, um dos mais pulsantes de Santa Catarina. Começou a carreira em 1988 e desde então participou de mais de 30 espetáculos com distintas linguagens, atuando como atriz, diretora, adaptadora, figurinista e dramaturga. Junto com Max Reinert, fundou em 1993 a Téspis Cia de Teatro. Denise já ocupou importantes cargos públicos, entre eles diretora do Teatro Municipal de Itajaí (2009 a 2011), coordenadora geral do Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha (2011) e da Mostra Internacional de Teatro de Grupo (2001 a 2004).

Como atriz, alguns de seus papeis mais marcantes foram representados em Medéia (na adaptação em forma de monólogo do texto original de Eurípedes), Helena (no premiado Bodas…um ato cotidiano) ou ainda como Rosa (na versão teatral do livro O Pequeno Planeta Perdido de Ziraldo). Como diretora, realizou Pequeno Inventário de Impropriedades, premiado espetáculo da Téspis, e coordenou, entre outras experiências, a Cia. de Atores e o Grupo Teatral Ogrupo. Hoje é coordenadora pedagógica da Téspis Cia de Teatro, com a qual está em cartaz com três espetáculos, coordenou o projeto Reciclando com Arte, vencedor do edital Petrobras Socioambiental – Comunidades (2104), e orienta o GET – Grupo de Estudos Teatrais e o Laboratório Cena Contemporânea.

Índice22 estreou no dia 18 de agosto de 2018, na Itajaí Criativa – residência artística, em Itajaí (SC), cumprindo 01 mês de temporada.

Foi selecionado para participar dos seguintes eventos:

  • Ocupação Itajaí Criativa, em Itajaí, SC, em 2018;
  • 6º Festival Brasileiro de Teatro Toni Cunha, em Itajaí,SC, em 2019;
  • 3º Conexões Contemporâneas, em Itajaí, SC, em 2019.
  • Em Cena Catarina, circulação SESC por 25 cidades do estado de Santa Catarina, em 2019;
  • Floripa Teatro – Festival Isnard Azevedo, em Florianópolis, SC, em 2019;
  • 21 dias de ativismo pelo fim da violência contra a mulher, em Itajaí, SC, em 2019;
  • 16º Festival de Teatro da Amazônia, em Manaus, AM, em 2022 (prêmio de melhor atriz e melhor dramaturgia – indicações para melhor designer de som, melhor dramaturgia do corpo e direção);
  • 50º FENATA – Festival Nacional de Teatro de Ponta Grossa, em Ponta Grossa, PR, em 2022;
  • Convidado para a mostra “SOLO, mas não só – mulheres em rede”, criada para a programação do Festival de Curitiba, em 2023;
  • Convidado para o “4º BQ(en)Cena – Temporada de Teatro”, em Brusque, SC, em 2023;
  • Selecionado para o “7º FESTEJU – Festival de Teatro de Jundiaí”, em Jundiaí, SP, em 2023.

foto by Leonam Nagel

Ficha Técnica

atuação e figurinos: Denise da Luz 
dramaturgia, direção, cenário e iluminação: Max Reinert
interlocução artística: Juliana Galdino
interlocução artística e ambientação sonora: Hedra Rockenbach
fotografia e assessoria técnica: Leonam Nagel
projeções: Ambar Audiovisual
design gráfico: Daniel Olivetto
assessoria de comunicação: Camila Gonçalves
operação técnica: Sabrina Francez
produção executiva: Téspis Cia. de Teatro
patrocínio: Prefeitura de Itajaí e Fundação Cultural de Itajaí, através da Lei Municipal de Incentivo à Cultura, com renúncia fiscal de BRASFRIGO S.A.

foto by Leonam Nagel

Sinopse

O que nos define como pessoas? As experiências que nos acontecem no momento presente ou as memórias que acontecem após o acontecimento? Em um mundo cheio de imagens e cenários possíveis, necessitamos que algo nos aconteça para termos a impressão de estarmos vivos. Em mundo cada vez mais “espetacular”, até que ponto somos capazes de fazer do nosso sofrimento e do sofrimento alheio um show em busca de views e likes. Se a popularidade é a medida para nossas vidas, por quanto tempo será possível manter-se vivo?

foto by Leonam Nagel

O que já se disse

A menor distância entre o mal e o sensacional

A dramaturgia e a direção de “Índice 22” emanam movimentos ambíguos ou, quem sabe, complementares, como o pulmão em sua sina vital de expandir e contrair o ar. Max Reinert assina e opera essas tarefas como arte total, à medida que também concebe a cenografia e a iluminação para o solo de Denise da Luz, da Téspis Cia. de Teatro, cuja qualidade de presença em cena demarca um lugar de coautoria no resultado do trabalho.
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O texto cria interseções surpreendentes com um conto do historiador e antropólogo potiguar Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), “A menina enterrada viva”, publicado em “Contos tradicionais do Brasil” (1946), na sessão “Natureza denunciante”.
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Referência na pesquisa e recuperação da oralidade das lendas, o folclorista Cascudo narra a história da criança assassinada pela madrasta. O pai fica triste, é enganado de que ela fugira de casa, até o dia em que contrata um homem para capinar o terreiro e este ouve a voz da menina vinda do chão, entoando uma cantiga.
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O conto está publicado no programa de mediação do espetáculo com o público – uma boa sacada para a experiência de navegar por zonas como que criptografadas do projeto, a começar pelo título, cuja chave estranhamente não é compartilhada.
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Foi preciso consultar um buscador online para saber que, inferimos, “Índice 22” remete ao teto da escala proposta nos anos 1990 pelo psiquiatra estadunidense Michael Stone, após longo estudo acerca da personalidade de criminosos. Para classificar comportamentos brutais que nem a medicina nem a psicologia explicavam a fundo, ele propôs uma gradação que vai do índice 1 (pessoas que matam em legítima defesa e não apresentam sinais de psicopatia, por isso são consideradas normais) ao índice 22 (psicopatas assassinos fixados em torturar as vítimas com motivação de cunho sexual). A peça toca no quanto o aparente prazer sofrido por uma vítima chama a atenção do mercado de cliques.
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Ao interlocutor do espetáculo não é dada margem para interpretar, essa tentação de agarrar-se a unidades de tempo e espaço. Não há “era uma vez” no fluxo de consciência dessa voz por meio da qual os criadores ambicionam discutir sobre como a internet amplifica a banalidade do mal no século XXI, para lembrar da responsabilidade individual que a filósofa Hannah Arendt problematizou no modo como o nazismo foi engendrado na Europa.
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Denise e Reinert excitam o imaginário da plateia com outras possibilidades de significação que não apenas pela via do verbo. A peça é labiríntica feito uma incursão anatômica pelas cavidades do organismo humano. O corpo é pungido por quem é torturado e abduzido pelo seu algoz. Já o que baila pela cabeça são pensamentos perturbadores ou capazes de produzir verdadeiras sinapses.
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A perversão espelhada no conto popular materializa-se numa dramaturgia cirúrgica, propulsora de poética a seco no modo de processar dados da realidade à luz da virtualidade da vida contemporânea. A escrita trava embate com a permissividade no território da web, combinando cenários do noticiário com subjetividades do desejo e do ódio.
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No início, o discurso fragmentado soa mais apoiado na corporeidade. Denise faz as vezes de caixa de ressonância das incertezas do que passou ou está por vir. O gesto ecoa e as falas permitem vislumbrar um elemento de psicoacústica (na frequência e amplitude), em consonância com a paisagem sonora e a expressão física. Sensorialidade introdutória dos estados performativos que vão se adensando até o fim.
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Apesar da partitura sólida, a constante temática de “Índice 22” é a instabilidade. As frases sobrepostas na projeção que atravessa o corpo de Denise transmitem saturação. Textura que remete à imagem de Isabelle Huppert estática e transpassada por raios de números e palavras em “4.48 Psychose”, da inglesa Sarah Kane, dirigida pelo francês Claude Régy e apresentada no Brasil em 2003.
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Na montagem da Téspis há momentos vertiginosos que se aproximam da realidade em 3D pela cintilação no desenho de luz. É quando se intensificam ares de miscelânea ou de “mash up”, a mistura musical de faixas instrumentais ou vocais muito comum nas mãos de DJ. Em vez da multidão na pista, temos a vocalização de um ser para tanto mal-estar.
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Quando a atmosfera turva atenua, a transmissão de uma “live”, na qual a fala chega mais compassada e predisposta a ser ouvida, o espectador haverá de reestabelecer as bases com a atuante em seu domínio técnico-corporal para desvencilhar-se do emaranhado que a encenação a enreda.
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O tempo real da transmissão e o crescimento de “likes” na proporção da camada de dramaticidade daquele instante configuram os mecanismos de apelo às premissas espetaculares da audiência na internet. O sensorial confunde-se com o sensacional. E assim o movimento oscilatório da obra e seu questionamento crítico sobre as relações tão fluídas quanto brutais assentam-se nessa conversa franca com a tradição do relato de caráter maravilhoso e o desespero que bate quando se vê o futuro de perto, cínico.
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Valmir Santos – crítico e editor do site TeatroJornal – Leituras de Cena

Este obscuro objeto do desejo

Agora já é passado. Quando escrevo estas palavras, “Índice 22” já se encerrou no tempo cronológico. Até que se refaça em outra noite de apresentação, a peça da Téspis Cia de Teatro é passado, morto. Ao mesmo tempo (o outro, o tempo subjetivo) faz-se presente reavivado em minha memória consciente e, talvez, inconsciente. O que essa efemeridade diz da realidade da experiência e de sua permanência?
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A companhia catarinense perscruta as dobras escuras da mente no solo de Denise da Luz, escrito e dirigido por Max Reinert. Faz da cena o cárcere obsessivo de uma subjetividade presa a uma espiral de ruminações. Angustiada por essa hipertrofia do pensamento, clama por que algo aconteça. Mas o que acontece é o próprio pensamento, que se faz ato e repetição.
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Tentado a compreender o mundo fora e dentro de si (um modo do ego dominá-lo), entrega-se a uma investigação reflexiva sobre o mal e o gozo em tempos de destituição subjetiva e sadismo compartilhado pelas redes sociais.
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A linguagem psicanalítica ensaiada nesta crítica serve à tentativa/tentação de abrir uma fresta para a luz na opacidade da cena armada pela companhia, sem reduzir as suas indeterminações e indagações a afirmativas e pretensas respostas. Fazer, talvez, pulsarem mais algumas inquietações.
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Índice 22” tem essa qualidade magmática de compostos voláteis em estado variável de fusão, que se acumulam sob alta pressão e temperatura e extravasam em erupções. Metáfora para o sofrimento psíquico que a encenação tangencia por meio do corpo da atriz, do corpo da tela, dos instrumentos musicais, do corpo da luz e do corpo das palavras. “O cenário era um bisturi penetrando na pele. Não, o cenário é a pele”. Ecos.
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Estalos
Nas primeiras imagens, sob uma paisagem sonora de nomes próprios, a luz se decompõe em camadas sobre a pele da atriz, que estala violentamente uma baqueta contra a superfície de uma caixa percussiva (cajon), produzindo batidas graves. Como um demônio narcísico de olhar perverso que se satisfaz com o acúmulo de excitações de uma cena em caos sinestésico.
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Adiante, essa cena convulsionada encontra paralelo numa espécie de infecção hacker que faz tremer os pixels e destrincha as cores dos textos projetados. A materialidade cênica colapsa ante as contradições da sobreposição: uma descrição sensorial em primeira pessoa de um ato de violência sofrido é recoberta por palavras conhecidas de julgamento e culpabilização da vítima.
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É impossível situar se essa disputa de vozes ocorre num tribunal, numa rede social ou dentro da mente de alguém. A dramaturgia se tece na indeterminação do sujeito e nessa multiplicidade de cenários em simultaneidade.
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Cenários extremos de violência e perversidade, aludidos por ruídos e nervos e vísceras autopsiadas. A(s) voz(es) subjetiva(s) encarnada(s) em Denise transita(m) entre esses destroços atormentada(s) pela ambivalência de um “prazer sofrido”. Paira a noção lacaniana de gozo como essa superposição de prazer e desprazer.
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Num palco amealhado de vestígios de narrativas interrompidas, a cena teatral ecoa a cena da fantasia subjetiva do obsessivo. O discurso cênico, em certo momento, faz-se como fala em transferência analítica. Como um ego aprisionado a esse frenesi narcísico do repisar da própria dor, debate-se contra o trauma como definidor de toda uma identidade. As descargas de energia excedente em ruídos e contrações impedem que o sistema se aniquile. É armadilha da qual não se escapa.
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Então, o fazer e refazer próprio do teatro, ressuscitado a cada nova apresentação, se assemelha a essa compulsão à repetição. Repetição daquilo que extravasa a economia psíquica e, por isso, não cessa de acontecer no tempo subjetivo. A atriz que repete noite a noite a corporificação de uma ficção diante de um público manifesta uma espécie de revivência do trauma, como quem, recusando a perda/morte, tenta/é tentada a estancar o tempo para manter aberta a ferida.
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A Téspis desce a esse obscuro abismo intrassubjetivo de estranhos objetos de desejo determinada a sustentar a insegurança de não se firmar nas certezas e reafirmações. Encontra o desafio de uma encenação do impalpável e do incomunicável que não se encerre em um autocentramento nem se torne obstáculo à escuta e à relação intersubjetiva.
A sinestesia da cena funciona como esse bisturi que pode rasgar a pele entre palco e plateia quando as ruminações da angústia se tornam inacessíveis em sua autorreferência narcisista. O risco remanescente é de um ataque aos sentidos que os sature de uma mesma tonalidade sombria, obliterando a percepção.
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Então, quais modulações rompem a gravidade? Como dar corpo cênico às contradições da perturbação psíquica? E como encenar a dor não tal qual paisagem que se observa afastadamente, objeto alheio, mas brecha à travessia sensível entre sujeitos?
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 Luciana Romagnolli – crítica e editora do site Horizonte da Cena

“Se você pudesse voltar no tempo… se você tivesse a chance de mudar alguma coisa… se você pudesse se despedir de alguém que já não está mais aqui… e se você pudesse eternizar tudo isso… o que você faria?

Índice22 é uma obra que fala sobre as várias formas de violência, também. Talvez, a pior forma de violência que é o esquecimento. Uma violência que é perpetrada contra nós e, às vezes, por nós também.

Índice22 é uma obra escrita e dirigida por Max Reinert e executada brilhantemente por uma atriz que eu tenho profunda admiração, que é Denise da Luz.

Ela vai estar em cartaz na Itajaí Criativa, então fica o convite para quem continua querendo inventar histórias, em vez de se livrar delas, do passado e continuar perpetrando esquecimento e apagamento. Fica o convite para que todos venham assistir essa obra brilhante.”

Juliana Galdino – atriz do Club Noir (São Paulo, SP)


“Uma vez mais, a Téspis Cia. de Teatro nos convida a estremecer-nos com a potência de seu teatro. A dramaturgia de Max Reinert é um terreno minado onde se agiganta a atriz Denise da Luz.

Rompe estereótipos, desafia a forma que se espera ver de uma atriz em cena. Ela fala com a voz primordial e nos apresenta uma mulher em que sintetiza a alienação do humano…

Somos conscientes da violência imposta? Até que ponto toleramos ser violentadas / violentados? Até que ponto toleramos violentar ou violentar-nos? Qual é o limite? Atua Denise da Luz, dirige Max Reinert, um convite que não dá para perder. Eles criaram essa experiência!”

Andrea Ojeda – atriz da Periplo Compañia Teatral (Buenos Aires, Argentina)


“Mais, ainda…o corpo

Já não temos outro dia. Este momento em que leres o que escrevi na noite após o espetáculo, já não há. Por outro lado, amanhã jamais será parte deste escrito. Mas é preciso escrever, deixar a impressão nos dias, nas pessoas, deixar também nossos corpos à disposição das inscrições.

As coisas acontecem assim, por choques, por contato. Algumas impressões, no entanto, são mais profundas, vão mais fundo na pele, no corpo, na cabeça. Algumas vezes a impressão rompe a superfície invadindo o corpo, barbaramente. Barbaramente, pois há requinte e técnica nos gestos sobre os corpos. Há requinte nas intervenções no corpo da cena.

O espetáculo Índice 22 em temporada na Itajaí Criativa precisa ser visto. Precisa ser visto por alguns motivos. A performance de Denise da Luz apresenta as possíveis faces que a maldade pode dar ou adquirir dos humanos. O Índice 22 é o último grau na escala da maldade humana me diz o dramaturgo Max Reinert. A dramaturgia se sustenta pela tensão equilibrada entre texto, corpo e paisagens sonoras. A ambientação coloca o espectador nos cenários descritos e sofremos os efeitos da montagem, experimentamos nossos corpos imersos na arquitetura dramática montada pela Téspis. Somos quase sequestrados para dentro dos textos.

A violência contra os corpos é constantemente apresentada principalmente aos telespectadores das redes abertas de tv, aos leitores de tabloides sanguinários, nas redes sociais e aplicativos cotidianos.

Acontece que através destas mídias, sempre somos salvos pelos cortes das edições que, por outro jogo estrategicamente elaborado para proporcionar alívio e conforto aos consumidores, parecem oferecer a redenção cortando as cenas, como quem corta a corda da forca evitando o choque com a violência extrema. Querem provocar a sensação catártica “ainda bem que não foi comigo”. Porém sempre é conosco, quando uma pessoa é violentada moral ou fisicamente. O corpo coletivo é atacado também quando tecidos, tendões e vísceras são extirpados do corpo. Neste espetáculo o corte das cenas acontecem um pouco além dessa linha de salvação.

O Índice 22 vive silenciosamente entre nós. “esperando que alguma coisa aconteça”

A dramaturgia materializa essa tensão sem muita generosidade para com o espectador. Não há como ser benevolente no tratamento de tal tema. Posso dizer que parece testar quão preparados estamos para a humanidade, manter a pressão alta da plateia. Nada mais coerente com o enredo da peça, do exponencial conflito e tortura submetida não apenas às vitimas, mas na complexa experiência do carrasco e de afetos desencadeados entre vítima e algoz.

Não há tempo. “Agora é passado” nos diz a personagem.

Luz, marcação e música calibradas com o texto, com o incômodo (variável em cada espectador) provocado pelo texto tortuoso, pela imagética e paisagens sonoras capturadas e editadas ao vivo, mais uma vez à flor da pele. Cada sequencia de imagens carrega o requinte tanto dos cenários apresentados nas narrativas.

As narrativas do Índice 22 são exemplares. Sempre há algum afeto nas relações violentas.

Tudo é mundo, mas sobretudo, tudo é dramaturgia então o “corpo vira cenário e o bisturi passeia pelo cenário”.

Experimentam-se níveis diferentes de tensão e importa perceber como nosso corpo reage a cada ritmo do texto e da atriz. Domínio de cena, de texto e do próprio corpo, dão ao espetáculo uma dinâmica que finaliza com a plateia no alto (poderiam ser medidos os batimentos cardíacos e saturação em cada espectador), a ponto de sublimar qualquer impressão dorida deixando o prazer fazer lastro para dar acesso à experiência estética proposta pela companhia.”

Cristiano Moreira – escritor e professor de literatura


foto by Leonam Nagel

Necessidades Físicas

Palco Italiano –
Caixa preta com as seguintes dimensões mínimas:
06 metros de largura
05 metros de profundidade
04 metros de altura

Iluminação
11 refletores LED 32W RGBW
04 refletores elipsoidais 1000W
06 estantes de iluminação lateral

Sonorização
Caixas com alta potência. Mesa de som com entrada para cabo P2.

Transporte
03 pessoas
(01 [uma] atriz e 02 [dois] técnicos)
Cenários são transportados com o grupo

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